quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

Mianheyo! Joensonghabnida!

Descrição para cegos - Foto de família coreana mostra pai e mãe
sentandos no chão sendo reverenciados por três crianças ajoelhadas
e curvadas. A cena é observada por outras quatro crianças

Por Sara Navarro


        Ainda lembro de umas das maiores surpresas e dificuldades que me deparei ao começar a estudar coreano. Assim como em algumas outras línguas do sudeste asiático, fato que só fui tomar conhecimento depois, algo chamou minha atenção: as palavras e o modo de falar se modificam de acordo com a faixa de com quem se fala. Explicando melhor: há um modo para falar com as pessoas da nossa idade ou mais novas, e um outro modo específico de estabelecer diálogo com pessoas mais velhas, não necessariamente idosas.
        Por exemplo, se alguém deseja desculpar- se com alguém da mesma idade ou mais nova, a palavra usada será Mianheyo (미안해요) ou Mianhe (미안해), forma mais simplificada. Mas se esse pedido de desculpas se dirigir a alguém mais velho, o modo correto de falar é Joensonghabnida (죄송합니다).



       Tal composição do idioma coreano pode parecer aos de fora regras desnecessárias e sem qualquer sentindo. Entretanto, não é. A Coreia tem toda sua cosmovisão e estrutura social baseada nos ensinamentos de Confúcio, originalmente da China. A confissão confucionista tem como base a lealdade familiar, a veneração aos ancestrais, e o respeito aos idosos e mais velhos, por já possuírem em sua trajetória de vida mais experiência e sabedoria. Esses princípios moldaram não só as relações interpessoais dentro da sociedade coreana, mas até mesmo a maneira de expressar a sua língua.
       Ainda que essa tradição anteceda o próprio Sejong, o Grande, rei que oficializou o alfabeto coreano (Hangeul), por volta do século V, tais princípios ainda permanecem enraizados na cultura, mesmo no século XXI. A Coréia do Sul, ao contrário do Brasil, não possui um estatuto próprio a favor dos idosos; o respeito aos anciãos é um compromisso social. Segundo um amigo coreano, Joseph Kim, nos ônibus há sim assentos especiais para os idosos, assim como no Brasil. A diferença é que, segundo ele, nenhum jovem usa esses assentos, mesmo que não estejam ocupados. Se alguém se atreve, todos os presentes assistem a tal ação com olhar de reprovação.
       É óbvio que a Coréia também tem seus equívocos e que nem tudo funciona tão bem quanto parece. Mas com certeza ela tem muito a ensinar às sociedades que têm cada vez mais valorizado a juventude e a beleza e menosprezado o "velho", o que possui rugas e marcas.
       Não precisamos reestruturar nossa língua a fim de que o Brasil tenha o respeito como um princípio, essa não é a questão. Os resultados do respeito e cuidado serão sentidos em outros aspectos e aplicações. Não precisamos ser uma Coreia ou um Japão. Precisamos apenas ser um Brasil em que o respeito seja um princípio e tenha valor em si mesmo.

Annyeong geseyo!*

 *Tchau! em coreano!

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